
Cada uma daquelas sementes guarda uma história longeva. Um mistério quase sempre indecifrável, uma ancestralidade intangível.
Amo saber que uma árvore inteira está ali, dentro daquele mínimo grão. E que cresce em silêncio num solo que provavelmente já a aguardava. Amo esse milagre tão fácil.
Essa abundância tão disponível.
.
Já há alguns meses tenho sentido profundo encantamento por elas.
Mas só ontem me dei conta do meu semear.
Deitada no sofá, no final do dia, meus olhos cansados encontraram, na minha varanda, uma paisagem inesperada: casquinhas rompidas e pequenas mudas saindo da terra. Uma castanha portuguesa, um pinhão, ervilhas e, minha preferida: pitaya vermelha.
Sementes me fascinam porque têm grande potência de vida.
.
E vida é um assunto que sempre me interessa.
Tanto quanto me assusta a possibilidade de deixá-la escapar.
Esta semana ouvi que o passado muda todo dia. Nele se acumula qualquer vida que não seja a contida neste instante.
Pensar que enquanto escrevo essa linha ela já não é minha, já faz parte do que não tenho.
É o agora se acomodando entre tantos outros passados.
.
A semente não. Ela guarnece o amanhã. Contém o futuro. É uma promessa.
Talvez por isso o meu encanto.
Cada minúscula folha que sai da terra salva um continente. Desafia a morte. Impede a finitude.
Assim como nós em nossa travessia diária. Somos o óvulo maduro e já fecundado da terra. Somos vida mesmo quando parece que não. Somos reservas e restauros. Promessas também.
.
Porque toda semente tem uma vida escondida dentro dela.
Assim como toda pausa protege um recomeço.
Agora quando sinto um hiato o acolho.
Mas só sossego quando rompo a terra.
.
Solange Maia
Nenhum comentário:
Postar um comentário