terça-feira, 24 de setembro de 2013

o segredo do vagalume...

para Monnica Moraes...


A menina corria ofegante pelas ruas de areia. Vagalumes eram entidades mágicas que ela queria ver, eram luzinhas de Natal fora de hora, estrelas ao alcance das mãos... criaturinhas que vinham prontas e lindas. Talvez por isso corresse atrás deles.
Talvez não.
A menina era fascinada por mistérios, e havia ali qualquer coisa querendo ser atravessada, havia mais do que se podia ver. Ela punha então, curiosa, o bichinho dentro de um enorme pote de vidro e ficava observando-o. Horas. Nem via o inseto, de alguma forma sabia que ele era mais do que a aparência que carregava.
Gostava de seus aspectos mais sutis, de suas pequenas exuberâncias. Olhava, olhava, olhava...
Sentia, muito mais do que sabia.
Devia ser alguma equação mínima, um segredo, um susto, um hiato... sei lá, nunca soube, mas sempre acreditou que descobriria no próximo verão.

O tempo passou.
Um verão. Outro. E muitos outros.
A menina cresceu.

Mas ontem, só ontem, como são todas as coisas que não se explicam, a menina deitada em sua cama viu um vagalume entrar, e não foi preciso mais do que um instante para que ela soubesse.
Soube depois de quarenta verões.
O vagalume carrega nele uma escuridão que ninguém vê.


domingo, 15 de setembro de 2013

feliz de quem sabe imaginar...

Olho para a cortina nova e sua transparência.
Deitada no sofá, tão à toa que o vento desloca facilmente meus pensamentos. Eles dançam, embaralham-se, adquirem sentidos renovados, e nem vejo mais a cortina. Vejo só um véu, cobrindo sem querer cobrir.
Meus olhos atravessam o tecido fino assim como se fossem línguas que desejam não ver. E não ver, nesse instante, é a forma mais generosa de brincar de imaginar...
A tarde terminando quente e perfumada, o desejo nascido do acaso, uma disposição lânguida e preguiçosa... e meus dedos (seriam os teus ?) agora só sabem percorrer os meus caminhos, todos, demoradamente... são horas boas, de vontades amplas e generosas.

Lembro-me, então, da cortina nova e de sua transparência.
Tanta coisa depois dela.
Tanta antes.
Levanto.
Deixo um sorriso de canto de boca pendurado no ar.
Adoro essas horas ébrias em que a consciência é a ultima a chegar.

terça-feira, 3 de setembro de 2013

os deuses não nos protegem...

Rubem Alves diz que os deuses não nos protegem do medo. Eles nos convidam à coragem.
Gosto tanto desse olhar... e tenho tido dias bem assim, com muitas mudanças, lugares e armadilhas emocionais sendo deixados para trás, coisas já sem sentido ou significado também, gente que não nutria... tudo de uma vez, ao mesmo tempo, como têm sido sempre.
E o medo está lá. Eu sei.
Mas nunca consegue ser maior que a mansidão que sinto nas pequenas (e muitas) alegrias que me cercam.
Minha coragem nasce desse reconhecimento : alegrias são possíveis mesmo na desordem, nos intervalos, nas dificuldades.
Aceito o convite dos deuses.
Aceito também essas mudanças todas. Acolho-as em mim.
Já faz tempo que aprendi a desobedecer o medo.