Então, daquela forma, pensava acender os caminhos. Queria não deixar nunca que o dia se apagasse.
quarta-feira, 19 de julho de 2017
para que não tenhamos preguiça de acontecer...
Podia ser dia, verão, ventania. A menina tinha sempre uma
vela acesa nas mãos.
Então, daquela forma, pensava acender os caminhos. Queria não deixar nunca que o dia se apagasse.
Sabia que para algumas pessoas os dias iam embora mais cedo:
encolhidos ou endurecidos.
E tinha medo que esse tipo de abreviação nunca terminasse.Então, daquela forma, pensava acender os caminhos. Queria não deixar nunca que o dia se apagasse.
A vida se apagasse.
Conhecia bem os caminhos de pedra que afastavam as pessoas
do que tanto lhes faz bem.
Conhecia bem as pessoas de pedra que evitavam os caminhos
que tanto podiam lhes fazer bem.
Aguardavam em seus esconderijos internos que a vida
consertasse o que fez.
E alimentavam assim, a potência paralisante dos que não têm
pressa. Viveriam amanhã.
Mas a menina entendia que o tempo não era feito para nos
consolar. Queria ser vivido.
Hoje.
Tudo o que podia fazer era trazer uma vela acesa nas mãos e
orquídeas escondidas no bolso.
E não parar de tentar acelerar sua ressurreição.
Ela amava as pessoas.
E sabia que as demonstrações de amor podiam consertar o
mundo.
Solange Maia
domingo, 16 de julho de 2017
difícil é ver alguém respeitar tristeza...
Difícil
é ver alguém respeitar tristeza.
Muito
mais difícil é ver uma tristeza sendo acolhida.
Já
uma perna quebrada, um hematoma, um mal estar, estão ali, tudo posto, visível,
compreensível e facilmente respeitável.
Tristeza
não.
Tristeza
é sutil.
Costuma
ser confundida com frescura, fraqueza, TPM ou mimimi. E é
sempre considerada passageira.
Não
é.
As
vezes a tristeza é o piloto. É perene, crônica.
E,
acredito, só sara no amor.
Nesse,
que as vezes a gente economiza com medo que acabe.
Mas
não. De novo não.
Amor
não acaba, ele sabe se multiplicar.
Dalva
estava triste.
Uma
tristeza pungente, já sem origem, cotidiana. Estava dolorida. Parecia
por fora, mas era por dentro que doía mais. Mas quase ninguém via.
Precisava
ser ouvida.
E
urgentemente abraçada.
Foi
o que fizemos... ontem, um pouco depois das nove. Dez adultos abraçando Dalva.
Ela
sorriu. E chorou.
E
sentiu-se muito melhor.
Foi
embora tão grata, fazendo mesuras com as mãos.
O
que talvez ela nunca saiba é que era eu sendo curada naquele abraço também.
Solange
Maia
anoto o gosto...
Cada coisa que me acontece, anoto o gosto.
Não no sentido químico, é claro, mas de uma forma diferente.
É que tenho um pequeno diário dentro de mim onde guardo o
sabor de alguns momentos que considero sagrados.
É lá que as coisas que amo se acumulam.
Essa semana foi assim: olhei para Bebela e senti as
primeiras notas adocicadas de quem já está virando uma mulher.
Num átimo de instante estava tudo ali, minha pequena bebê
falante, a menininha do pé preto, e uma mocinha linda. Todas moram nela.
Anotei esses muitos sabores e suspirei demoradamente.
É que são tantos os açúcares contidos nela...
Solange Maia
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