E a ideia do desprendimento era sempre tão tentadora que te fazia desejar viver distante.
Não gostava nem de interferências nem de opiniões.
Reservava para si seu recôndito em frente ao mar.
Você não sabe, mas eu torcia para que fosse mentira, só um capricho, uma teimosia.
Ficava imaginando que talvez tivesse havido um tempo em que você gostasse mais dos afetos e das presenças.
Mas de tanto repetir que amava sua independência só o que criou foi um distanciamento. Uma ausência.
E o tempo, impetuoso, decorre insensivelmente sem conceder chances de bis.
Passou.
E agora? Agora é como se houvesse um toque de recolher mudo: não se ouve, mas sabemos que está lá.
Talvez por isso os dias estejam nascendo mais escuros, cheios de horas vagas, cheios de vazios.
Encolho-me de frio. Sinto um cansaço tão grande que dá vontade de chorar.
Quando penso onde você está agora, tudo em mim desmorona.
Então fecho os olhos e te tiro dali.
É de novo aquela mulher linda. Segurando o microfone com os olhos fechados, num bar perto da praia.
Sua voz aveludada começa a canção: “Ne me quitte pas” ... Engulo em seco.
Finjo que não morro por dentro e torço para que o tempo lhe devolva o seu mar.
Acreditar é meu modo de tornar suportável o insuportável.