segunda-feira, 27 de outubro de 2014

o amor é normal...

Ele olhava pra ela com ternura. Ela sorria com o braço estendido sobre as costas dele e deixava escapar pelos olhos uma alegria simples, dessas de quem entende que o amor não devia mesmo ser nada demais. Aceita e acolhe como a coisa mais natural do mundo. Não tem medo. A mãe dela afasta o corpo só um pouco, o suficiente para poder olhar a cena. Eles cabiam inteiros, assim entrelaçados, na vida dela. Volta o corpo para perto dos dois. Agora eram os três numa preguiça generosa, dessas que só acontecem nas manhãs de domingo, dessas onde cabe tanta coisa, onde há tanto a ser dito, e mesmo assim a atmosfera é tomada por um silêncio amplo e confortável que muito se parece com um abraço. E, com uma naturalidade que é delas, iam fiando o afeto e reduzindo a fio tantos emaranhados que para elas estavam longe de parecerem grandes. Elas gostavam do amor. E gostavam dele. Descomplicadamente.

Ele, entre uma risada e uma história, engoliu as letras ásperas de resistência. Percebeu que já não cabiam. Na sua boca, até mesmo aquele punhado de regras a respeito do que devia ser feito, e do que não, ficaram mudas. Tudo se dissolvendo diante da simplicidade do gesto.  

Na boca dele só um sorriso de quem começava a desconfiar que o amor era mesmo a razão para que tudo aquilo que antes disso parecia absurdo, parecesse agora a coisa mais normal que existe.

Solange Maia

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

LEGO

- Eu quero - escrevo.
- Eu vou - ele responde.
- Então vamos - finalizo.

Parece slogan de campanha publicitária. Mas não é.
É o amor brincando com a gente, cheio de intimidade. Um jeito nosso de dizer que temos quereres comuns e que estamos juntos, porque é exatamente assim que estamos : juntos.
E posso jurar que sei exatamente a cara que você faz ao ler e ao escrever essas palavras.
Assim como posso jurar que já sei a diferença da sua voz quando você está trabalhando, quando está com sono, ou quando quer me namorar. Sei como gosta que eu arranhe tuas costas, qual é o seu travesseiro preferido, o ponto da tua carne, as pintas no teu corpo, a planta do teu pé.
Sei das suas sobremesas favoritas, de todas as cores dos teus olhos, da espessura da tua barba cerrada, e das músicas que ama ouvir. Sei da sua ternura e também do seu perfeccionismo, sei da musculatura emocional que tem criado ultimamente, e dos desafios a que, corajosamente, se propõe. Sei que cuida de mim mesmo quando me acha muito, muito chata. Sei do frio que sente no pé, da temperatura que gosta da água, e da fome que sente pela vida.

Sei que temos tido muita sorte, mas sei, sobretudo, do tanto que temos cuidado da gente e do nosso amor.
Entra dia, sai dia... e assim temos construído nossa relação. Um amor calmo, quente, e feito pra durar.
Entra dia, sai dia... e você continua sendo minha pessoa favorita nesse mundo.
O lugar onde gosto de estar.

Tenho acreditado de novo. 
Temos nos dado novas chances. 
Temos nos divertido.
A verdade é que o mundo ficou bem mais bonito desde que você chegou, então sorrio e confesso, é impossível não dizer :
- Eu quero.
Irresistível não sorrir ao ouvir a resposta :
- Eu vou.

É, amor...
- Então vamos - finalizo.

Meu momento predileto ?
São tantos, mas nossa ‘conchinha’ na hora de dormir tem sido praticamente insuperável, tudo encaixa, como num LEGO, ele costuma dizer. Somos feitos de carinhos que não dormem, de abraços côncavos que nos permitem sonhar antes mesmo de dormir.
Temos construído
Solange Maia

domingo, 12 de outubro de 2014

in-fi-ni-ta-men-te maior...

O amor não força nada, ao contrário, ele abre caminho.
William P. Young
 
Há anos tenho falado sobre a vida e sobre o amor. 
Já escrevi antes sobre 'primeiras vezes', e sobre algumas pessoas especiais. Rotulei como 'grandiosas' muitas dessas experiências, porque sim, foram mesmo grandes momentos. 
Mas a vida, surpreendente que é, veio e me trouxe o novo, 
o in-fi-ni-ta-men-te maior, o inacreditavelmente mais bonito. 
E agora, que tudo foi redimensionado, só o que me vem à cabeça são as palavras de Clóvis de Barros Filho, numa entrevista que deu e que nunca mais me esqueci. Tenho-a gravada em meu celular, e ouço vezes sem fim, no trânsito, em casa, no escritório. Ele diz que devemos saber que "...estamos diante de um mundo extraordinariamente competente para nos entristecer, mas que, aqui e ali, esse mundo também é capaz de nos proporcionar grandes alegrias, grandes surpresas, e momentos que a gente nunca mais gostaria que acabassem. E são esses momentos que a gente ‘persegue’, que farão da vida, sempre alguma coisa digníssima de ser buscada, e fantástica de ser vivida."
Cheguei a duvidar dessa ‘grande alegria’, e dessa ‘grande surpresa’, mas agora, diante delas, e vivendo um desses momentos que eu gostaria que nunca acabasse, rendo-me.
Rendo-me completamente.
Rendo-me porque, de repente, sem planejamento algum, deixei você pegar na minha mão, e soube, naquele exato segundo, que você era a mão que eu havia esperado por tanto tempo.
Você foi a 'grande surpresa'.
E temos sido, desde então, essa 'grande alegria'.

E já não há mais verso. Nem prosa tampouco.
Não escolho mais as palavras.
Elas saem displicentes, indiferentes a mim. Já sabem o que querem contar.
Agora não escrevo mais para enfeitar a página.
Escrevo para enfeitar o nosso amor.
Para guardá-lo, para lermos juntos daqui a cem anos.
Escrevo porque preciso falar com você. Porque sinto saudade mesmo quando ainda está aqui, porque nosso querer não tem cabido só nos dias, só no tempo, só no agora.
Escrevo pra te fazer carinho, pra te alcançar nesse espaço mínimo antes de você chegar.
                                                                                            
E já não há mais verso. Nem prosa tampouco.
Já não escrevo palavras que alimentam o desejo, para que dele se alimentem depois. Nem faço poesias narrando incompletudes amorosas, em que amantes ora estão, oras não estão. Já não quero contar histórias de amores que se distanciaram, e que não se correspondem mais.
Já não vivo tentando lembrar qual era o gosto que faltava, o que não havia, ou onde doía.
Com você eu tenho tudo.
E, acredite, nem sabia que isso era possível.

Agora escrevo porque descobri que quero passar o resto da minha vida com você. E, porque desejo que o resto da minha vida comece o mais rápido possível.

Solange Maia

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

hipérboles de volúpia e ternura...

E se, de repente, cada alegria nova desfaz um nó ?
E se a gente nem acreditava mais que esses nós podiam ser desfeitos ?
E se, de repente, nossas convicções começam parecer endurecidas demais ?
E se a gente sentir uma vontade imensa de rever as ideias, de olhar por outro ângulo, de nos dar uma chance, de ignorar os julgamentos e de ser feliz, estupidamente feliz ? 
E se, de repente, nos dermos conta que bem no meio da nossa vida tranquila e sossegada, surgiu aquele alguém que muda tudo que a gente já foi ? 
E se essa pessoa vira imediatamente uma música em looping infinito na cabeça da gente ? E se a gente não quiser nem um pouquinho dar stop nessa música ? 
E se, de repente, todas as coisas prontas que a gente sabia descobrem-se na verdade apenas começadas ?
E se o que antes era muito vira agora muito pouco ?
E se, de repente, um único beijo dura duas horas, e a gente nem se lembrava que isso existia ?
E se já não sabemos onde fica a fronteira que divide a paixão e o amor, porque tudo anda deliciosamente misturado ?
E se, de repente, um olhar entra dentro da gente e nos faz sentir absurdamente amados, desejados e cuidados ?
E se a gente nem quiser mais se proteger ?
E se, de repente, a gente descobre que existe sim alguém capaz de perceber que mora um poema inteiro dentro da nossa boca ?
E se agora a gente sabe que saudade é uma coisa muito, muito sem graça ?
E se, de repente, a cama branca já não combina mais com esse sexo tão gostoso, onde o coração pulsa em sintonia com o tesão, e a gente desenha hipérboles de ternura nas costas voluptuosas do outro ? 
E se a gente começa a querer enfeitar a vida do lado de fora, só pra combinar mais com o lado de dentro ?

Solange Maia