sexta-feira, 20 de março de 2020

onde foi que nos perdemos?

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A mulher apressada almoça enquanto caminha. Seu sanduíche insípido é frio, embrulhado no alumínio.
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O pai absorto, envolvido no computador, não ouve. Seu filho o chama. Uma, duas, três vezes. Toca em sua perna e desiste. Ele nem percebeu.
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O casal discute de forma imatura. Não há consenso sobre onde passar o Natal. Então gritam. E preferem o divórcio.
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A moça de bicicleta não relaxa. Não há paisagem quando se sente medo. Em seu pavor ninguém se isenta. O passeio é deserto por dentro.
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Corpos suados e entrelaçados na cama não duram. Celular em punho e foco nas redes. A tela rola e eles nem veem. É preciso estar ali, mesmo que nem um e nem o outro, saibam exatamente o porquê.
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Na academia pessoas indo aos seus limites. É preciso ter o corpo perfeito e em dia. É nojento não ter.
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O aluno agressivo não quer aprender. Deseja subjugar. Sua matemática o faz crer que: se seus pais pagam, à professora só resta obedecer.
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A menina beija sem saber sequer o nome de quem beijou. São tantos. E quantos desejar. Diz que nasceu dona de seu corpo e faz dele o que bem quiser.
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Mais preenchimento, mais boca e mais cabelo. Para os dentes, lentes. E um Dry Martini para amenizar. Ter 50 anos é inaceitável. Só pode ser uma negligência.
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O rapaz do carro ao lado sorri. Ela fecha a cara. Uma ameaça? Qualquer um é criminoso até que se prove o contrário.
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E assim vamos minguando, desaparecendo por dentro, vinculados somente por nossas vulnerabilidades.
Famintos de afetos e de verdades. Nutrindo nossos vazios com migalhas e fantasias.
Perdidos e apáticos.
Sem saber mais onde foi que nos perdemos.
Sedentos por qualquer encontro que nos lembre de quem somos.
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Por um mundo com mais amor. Por favor.
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Solange Maia

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