sexta-feira, 18 de agosto de 2017

não queremos mais subir nos pódios...

Aprendemos a rir, falar, gesticular.
Aprendemos o corpo que devemos ter e as roupas que devemos usar. Então, o que fazer quando percebemos que não nos encaixamos mais nesses padrões?
Olho pra mim e vejo uma barriguinha redonda, suave. Os quadris bem mais largos, risadas sonoras, gestos amplos, menos filtros. Muito menos.
É assim que é. É assim que somos.
Para gente de olhos doces isto nos faz acolhedores, naturais, de verdade. Para os mais afoitos, isto nos exclui dos padrões.

Mas chega um tempo em que não queremos mais subir nos pódios, queremos só ternura, amores para pertencermos e algum lugar para descansar.

Já houve o tempo dos que estavam com “tudo em cima”, da perfeição festejada, do instante.
Mas agora que conhecemos a transitoriedade da perfeição, sabemos que ela tem data para acabar.
E passamos a querer as eternidades.
Quem já percorreu boa parte do caminho sabe que o tempo não poupa ninguém.

Esta beleza padrão, aprendida e esperada, é uma imagem bastante sabida, mas pouco nítida.
Temos vontade de ver as marcas deixadas pela vida. É a assimetria de nossos contornos que nos valida, os efeitos da gravidade que nos fazem reais e tão parecidos. Ah, sim, nossas deliciosas imperfeições são nossas assinaturas, a prova viva dos nossos caminhos.

E não pensem que nos falta apetite.
Nesta altura nos permitimos estar alheios às regras, sobretudo a das decências.
Amamos imaginar. Nossos pés nus bastam como insinuação à outra nudez.
Despir já não assusta e não há mais pressa, nenhuma.
Sabemos que imaginar é estender o prazer.
Desejamos devorar o amor.
Desejamos ser felizes.
Afinal, padrão é só um ponto de vista.
Só um lado da moeda.

Solange Maia


* fotografia de Chico Batata

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