quinta-feira, 14 de novembro de 2019

ainda revelo muito pouco...


Constituí uma espécie de esfera íntima onde guardo pessoas muito especiais.
Com elas sinto todas as minhas perdas consoladas e todos os meus bens protegidos.
Sinto que deixo suspensas minhas buscas incessantes e minhas certezas endurecidas.
Posso ser eu. Sem estar subordinada a reservas e a retrações.
Não sei explicar, mas ainda assim, sou virada para dentro. Revelo pouco a respeito dos meus vazios.
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Com o copo cheio, perto de transbordar, percebo que ando contando fragmentos da minha vida.
Parece que agora, para conservar íntegras as minhas forças, preciso purgar minha história e me livrar um pouco das minhas dores.
Revelo segredos esparsos, mas sempre os mais profundos. Não há vontade de promover polêmicas ou debates. Só de revelá-los, nutrindo assim a esperança de que saiam um pouco de mim.
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Sabemos todos que a vida não subsiste sem renovação, e que, de vez em quando, é preciso esvaziar para pode prosseguir.
Mas, mesmo que eu tenha deixado encapsuladas algumas memórias, mesmo que as tenha trancado em gavetas escuras e que agora, de alguma forma, as partilhe e expurgue, no fim do dia elas ainda estão lá.
E por onde quer que eu vá, vão comigo.
O fato é que nunca conseguimos fugir de nós.
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Resta então abandonar a tirania inflexível do medo e a rigidez das minhas construções interiores.
Quero viver o mais plenamente possível. Já sei que o tempo se encarrega de mostrar todos os caminhos, sobretudo os novos.
Sei também que nesses pequenos círculos de confiança posso descansar, me reinventar e criar outros sonhos.
Afinal, o amor é uma beatitude da alma, uma sorte da vida.
Só ele é capaz de virar páginas.
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Solange Maia

(ilustração da polonesa Magdalena - Bubug)

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