quinta-feira, 14 de novembro de 2019

não sei exatamente o que dói...

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Teria sido uma quarta-feira como as outras, não fosse aquela dor. Parecia neblina gelada percorrendo minha cintura em espirais difusas que chegavam até o pé. Uma experiência sensorial terrível, ininterrupta e intensa. Impossível desviar a atenção. Sentia que qualquer fio de pensamento lógico estava sendo eclipsado por aquela onda imensa e desconhecida. Descobri ali que a dor, diferente do que imaginava, nos afoga por dentro.
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Pinçamento do ciático, analgésicos e anti-inflamatórios. Muitos, muitos dias de um percurso longo e frustrante. Nunca para de doer. E a mulher forte que me habita começou a se sentir desabrigada. O impacto emocional da dor talvez seja maior que o físico. Se, no corpo, esse exílio causa estragos, na mente pode ser ainda mais devastador. Uma fragilidade que nos exaure, nos põe humildes e nos torna ainda mais gratos.
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Descobri também que algumas dores são entidades sensoriais múltiplas, vêm como avalanches, não permitem esquiva. São dores que nos confundem e já não sabemos mais exatamente o que é que dói. Se é o nervo, se é a vida, se somos nós, nossos amores, o que não conseguimos ser, o que já se foi... É que a dor dá existência a coisas que não existem, invoca emoções e fantasias que muitas vezes são só traduções dos nossos medos e das nossas vulnerabilidades. Mas, que parecem bichos-papões enormes, parecem.
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O que percebo enquanto vasculho meus alicerces mais profundos em busca de alguma explicação, é que o verdadeiro conhecimento só se dá pelos sentidos. O corpo dói e, cansado, faz a alma doer. Mas sei que toda especulação filosófica nascida dessa exaustão, tentando entender o que é a dor, é uma ilusão. Não combina comigo. Viver implica movimento, eu sei. E não há movimento sem esforço ou sem atrito. Não há vida sem esses arranhões.
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Meu olhar quer se derramar sobre a vida, sobre a saúde e sobre a certeza de que tudo passa. Torço diariamente para que a alegria prevaleça. Sempre vou escolher olhar para quem está ao meu lado, para as mãos estendidas, para o afeto e para o amparo. Prefiro seguir agradecendo todas as sortes bonitas em minha existência. Nada pode ser mais potente e real do que o amor que sinto pela vida.
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Solange Maia

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